Exclusivo! Você vai ver imagens que resumem um absurdo! As imagens foram gravadas em Bangu IV, cadeia vizinha a Bangu III - que viveu, durante a semana, a mais longa rebelião na história do Rio de Janeiro. Os flagrantes revelam: tudo que é proibido existe dentro de um presídio que deveria ser de segurança máxima: dinheiro, celulares, rádio-transmissores, maconha, cocaína. Lá, os bandidos se sentem em casa - uma grande boca de fumo.
Eles estão à vontade. Falam ao celular, usam o rádio, vendem drogas, fumam maconha. Satisfeitos, fecham negócios. Distribuem sorrisos pra todo lado. Em nenhum momento são incomodados por agentes penitenciários.
Quem vê a cena de relance, pensa que estes homens estão num clube, aproveitando um dia de folga, ou numa colônia de férias. Mas eles são detentos e cumprem pena em Bangu IV, no Rio de Janeiro. Um presídio de segurança máxima.
As imagens, gravadas com uma câmera escondida, foram feitas há 45 dias e provam que os bandidos fazem o que querem em Bangu IV.
Do lado de dentro, nos corredores, vendem maconha e cocaína. Chamam os fregueses como se estivessem numa feira livre.
Você nunca viu na televisão uma demonstração tão ostensiva de abuso dentro de um presídio. Você já tinha visto aqui no Fantástico que o termo "segurança máxima" não se aplica ao complexo penitenciário de Bangu.
Ano passado, o Fantástico mostrou o retrato do absurdo: um pé de maconha crescia dentro do presídio.
Há três meses, uma câmera flagrou detentos fumando e vendendo maconha no pátio de Vicente Piragibe, uma das 14 cadeias do complexo.
O sistema não consegue prever e nem impedir chacinas como a de 11 de setembro de 2002, comandada por Fernandinho Beira-Mar em Bangu I.
Em julho deste ano, Marcinho VP, ex-chefe do tráfico no morro Dona Marta, foi encontrado morto dentro de uma lixeira, em Bangu III. Dias antes, Paulo Roberto Rocha, coordenador de segurança, havia sido assassinado.
No início de agosto, mais uma vítima: o diretor de Bangu III, Abel Silvério de Aguiar. E até hoje não se sabe quem mandou matar, em setembro de 2000, a diretora de Bangu I Sidneya dos Santos.
"É muito fraco o sistema de vigilância nas unidades prisionais do Rio de Janeiro", avalia Josias Alves Belo, presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários.
São 12 mil presos em todo o complexo, controlados por apenas 180 agentes penitenciários mal remunerados. Fica difícil impedir a entrada de celulares, drogas e armas. E também de evitar uma rebelião como a que aconteceu esta semana em Bangu III.
"Cadeia hoje em dia, quem manda é o dinheiro, se você quer saber. Tendo dinheiro, você tem tudo", revela um ex-detento. Ele saiu há dois meses de Bangu IV, o mesmo lugar onde foram gravadas as imagens. Ele conta que lá dentro o tráfico de drogas é escancarado: "O que movimenta a cadeia é a droga. A droga na cadeia é tipo um banco".
É inacreditável: uma boca-de-fumo funciona a mil dentro de um presídio de segurança máxima. Quase todos têm celular. Alguns também usam um rádio-transmissor. O aparelho é o preferido dos bandidos, porque oferece mais segurança, é difícil de ser monitorado pela polícia.
O que se vê nos corredores é ainda mais assombroso. Traficantes gritam, anunciam as "ofertas". Levam nas mãos sacos cheios de maconha e cocaína. Os interessados se aproximam e compram a droga. Eles não estão preocupados com os agentes penitenciários por um motivo: os agentes que deveriam reprimir os presos foram subornados.
O acordo fica bem claro numa das seqüências gravadas. O carcereiro entra na cela, o traficante grita para encorajar os companheiros, assegurar que não há o que temer. O carcereiro sai. O traficante vai atrás e repete o chamado. Logo, os presos começam a chegar. O agente penitenciário nada faz.
A conivência tem um preço: ou melhor, uma tabela de preços. "Hoje em Bangu IV, pra entrar um quilo de maconha, R$ 400. Trezentos gramas de pó, R$ 600, R$ 700. Haxixe, R$ 5 cada um. Garrafão de vinho são R$ 50", detalha o ex-detento.
Uma visita íntima clandestina sai por R$ 30. Um telefone celular pode custar de R$ 70 a R$ 100.
"Tem comida, mulher, droga, cachaça, fita pornô, vídeo, sexo, tem tudo. Só não tem a liberdade", conta.
"O estado é omisso, o estado não tem uma política de segurança penitenciária definida, o estado trabalha no improviso, na questão do sistema penitenciário", avalia Josias.
"Sobre o mau agente, nós podemos dizer o seguinte: nós temos uma herança de agentes penitenciários formados em gestões anteriores. É um legado que nós temos do que há de bom e do que há de ruim nesta categoria", explica o secretário de Administração Penitenciária, Astério Pereira dos Santos.
O governo do Rio alega que vem fazendo o possível. A questão do uso de celulares, por exemplo, deveria ter sido resolvida com os bloqueadores instalados nos quatro presídios.
Acontece que o sinal interfere em alguns telefones da vizinhança. Para atender as reclamações, as operadoras instalam novas antenas na região, mais potentes, que acabam anulando a ação dos bloqueadores.
"Ou a questão da segurança está acima de tudo isso, ou então não vai ter jeito nunca. Vai cercar de bloqueadores de tudo quanto é jeito, de tudo quanto é lado, e vai ter sempre uma nova antena, mais possante", opina Marina Maggessi, coordenadora de Inteligência da Polícia Civil.
As operadoras se comprometeram a apresentar no dia 16 um projeto para solucionar o problema. "Se eles não foram capazes de evitar o sinal de telefonia celular, que eles sejam responsabilizados pelo ônus de instalação de bloqueadores de celulares dentro dos presídios, que o estado já instalou em quatro. E que eles fiquem responsabilizados também pela eficácia dos bloqueadores", declara Astério.
Enquanto isso, dentro de Bangu IV, um presídio de segurança máxima, muitos presos condenados por tráfico de drogas continuam a fazer o mesmo que faziam nas ruas. E assim, eles vão tocando a vida: sorridentes e impunes.
fonte:globo.com/fantastico